segunda-feira, 23 de março de 2015

Feminismo e Humanização do Parto: uma combinação necessária


Imagem do Projeto Fotográfico 1 em 4
A ideia de humanização do parto está intrinsicamente ligada ao protagonismo da mulher e à sua autonomia sobre seu corpo. Não há humanização desvinculada dessas premissas. Até por isso, uma cirurgia cesárea pode ocorrer de forma muito respeitosa, mas nunca será humanizada, visto que o sujeito ativo da cirurgia é o médico, sendo dele o protagonismo pelo ato.*

O movimento da humanização se mostrou fundamental frente à realidade de nascimento no Brasil: em que a mulher é tida como incapaz de parir e por isso um parto normal não humanizado significa se submeter a uma série de intervenções desnecessárias que violentam tanto a mulher como o bebê e que a cada dia se mostram mais institucionalizadas dentro do sistema hospitalar.

Toda essa medicalização e hostilidade perante o nascimento são reflexos de como a sociedade encara o corpo e a sexualidade feminina. Porque o parto é sim a continuação do sexo. E sexo e prazer para a mulher são tabus.

A naturalização da violência obstétrica é fruto de um sistema patriarcal que subjuga a mulher. Combater estas violências, então, implica em lutar contra o machismo e contra essa estrutura social.

Ao meu ver, portanto, não existe humanização sem feminismo. Porque se a humanização é a luta pelo respeito à mulher e sua autonomia, como tratar disso se não sob a ótica feminista? Qualquer tipo de humanização que menospreze o feminismo tenderá a ruir.

Se não se mantém coerente o pensamento de que a mulher é protagonista de sua vida, que não lhe cabe tutela, não há como ter humanização. Não tem como defender o patriarcado e se declarar defensor da autonomia da mulher sobre seu corpo . São coisas que se repelem.

Premissas como a garantia da autonomia do corpo e a igualdade de gênero quando ausentes na assistência ao parto acabam por repetir o modelo tradicional de assistência, visto que a naturalização e consequente normatização das violências obstétricas decorrem justamente da subjugação do gênero feminino tão combatida pelo feminismo.

Infelizmente o movimento pela humanização no Brasil ainda é muito pequeno e conta com poucos expoentes, embora seja visível o grande crescimento que se obteve nos últimos anos. E pelo movimento ainda ser pequeno, que é necessário se preservar essas poucas vozes que lutam pelos direitos das mulheres.

Contudo, preservar não pode significar a defesa a qualquer custo. Porque se há um profissional que se diz humanizado (e ironicamente se autointitula salvador de mulheres devolvendo-as o protagonismo no parto) mas defende o sistema patriarcal como um sistema de sucesso que protege as mulheres, esse profissional pode ser tudo, menos humanizado. Porque não dá pra trocar a tutela do cesarista, pelo dito humanizado. Na humanização não cabe tutela de ninguém, cabe somente o respeito à mulher e ao bebê.

No momento em que é mais importante manter nomes (mitos) da humanização do que combater o patriarcado, que é o grande causador da cultura de VOs, é porque a luta se perdeu, e o sistema opressor voltou a girar pro mesmo lado.

Este texto se originou de uma discussão que também fez surgir esse aqui.


*Essa frase foi bastante problematizada e acabei mudando de opinião sobre a questão do protagonismo mesmo na cesárea. As reflexões que surgiram podem ser lidas aqui.


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