quinta-feira, 16 de abril de 2015

Por que a infância se torna pejorativa?

Há um tempo me chamaram a atenção para o uso do termo "infantil" de forma pejorativa. Sabe quando nos deparamos com alguém imaturo e logo dizemos: "parece criança!" ou "quanta infantilidade"? O mesmo se repete quando associamos a adolescência com comportamentos inconsequentes.
Pois então, associar a infância e a adolescência a um comportamento indesejável diz muita coisa à respeito do que realmente pensamos sobre essas fases. 

Foi então que hoje tive a sorte de ler esse texto lindo e esclarecedor da Ludmila Franca. Respeitar a criança e o adolescente significa também compreender a importância da vivência dessas fases da vida.


"Até ontem, eu chamava adultos imbecilizados, irresponsáveis, arrogantes, fúteis, superficiais e narcisistas de "eternos adolescentes". Era uma enorme injustiça da minha parte, como também um dia chamei de "infantil" esses comportamentos. É injusto associar a imaturidade natural e inerente aos processos juvenis (anímicos e biológicos) ao comportamento imaturo de quem já viveu todos estes processos de amadurecimento e opta por uma vida sem sentido e fútil dentro de panelinhas e farras sem fim. Chamar de "infantil" ou "adolescente" gente adulta que não incorpora seu tempo é uma forma de adultismo. São a infância e a adolescência similares ao comportamento deplorável do adulto? É assim que adultizamos nossos filhos, exigindo deles "maturidade" no momento em que eles ainda não dispõem sequer de estrutura biológica para tanto. É tachar seus comportamentos de forma negativa, porque são tomados pela linha de conta da perspectiva do adulto. Não. Adulto fútil é fútil. Adulto egoísta é egoísta. Adulto imbecil é imbecil. Não é "infantil" nem "adolescente", pois os comportamentos, que podem ser deploráveis na perspectiva do adulto, são normais e saudáveis na estrutura de desenvolvimento de crianças e adolescentes. É o adulto que está fora de lugar e de tempo, e não o comportamento do jovem que é "errado". 

Essa deslegitimação adultista produz, para a juventude, o fardo de ter suas condutas medidas pela mesma régua com que se mede as condutas dos adultos. Disso surge, por exemplo, o desejo punitivo e policialesco de reduzir a maioridade penal para 16 anos, impondo responsabilidades adultas bem no meio do processo de desenvolvimento juvenil, como se o jovem já pudesse arcar com o mesmo que um adulto. Também surgem as projeções, que gostam de colocar crianças sérias, vestidas com elegância, sofisticação e requinte, tocando violinos, ouvindo Mozart e discutindo Van Gogh aos 5 anos de idade, que não assistem desenhos animados e outras "infantilidades", mas sim a filmes do Von Trier, que falam 8 idiomas antes de completar 10 anos e que se preparam para fazer vestibular com 16 anos para "orgulhar" seus pais, que dirão: eis aí os meus genes, olha como sou fantástico, olha meu clone! Orgulho, na língua dos pais, é puro narcisismo, que transforma filhos em meros aglomerados de "meus genes", joguetes de frustrações, espelhos onde eu me admiro.

A expressão "eterno adolescente", assim como outrora o "adulto infantil", morreu no meu vocabulário. Breve serei mãe de uma adolescente e espero poder ampara-la neste difícil - porém bonito - momento de crescer e amadurecer, sem julgamentos e intolerância. Apenas amor, paciência, acolhimento e muito (mas muito!) respeito."



Agradeço também à Cristiane Matos que trouxe a reflexão quanto ao uso do termo “infantil” de forma pejorativa.

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